Rui Pinheiro, piano / Ana Quintans, soprano /
João Rodrigues, tenor / Janete Santos, flauta transversal /
José Manuel Brandão, piano / Coro de Câmara de Lisboa /
Teresita Gutierrez Marques
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Víctor Macedo Pinto (1917 – 1964)
Victor Coelho Macedo Pinto nasceu no Porto, em 1917. Distinguiu-se como compositor, pianista e crítico musical. Foi discípulo de Luís Costa, Vianna da Motta e Winfried Wolf, em piano, e de Cláudio Carneyro e Fernando Lopes-Graça, em composição.
Personalidade multifacetada e de sólida cultura, além de exercer uma notável carreira de pianista, foi professor nos Conservatórios de Coimbra, Braga e Porto, onde leccionou nos Cursos Superiores de piano e Composição.
De entre as publicações para as quais Victor Macedo Pinto escreveu, contam-se o Diário de Notícias, Jornal de Notícias, O Primeiro de Janeiro, Seara Nova, Gazeta Musical e Arte Musical.
A par da sua carreira como músico, Macedo Pinto formou-se em Direito na Universidade de Coimbra, exercendo a magistratura nos Tribunais de Trabalho. Em 1948, ingressou na carreira diplomática, desempenhando funções no Ministério dos Negócios Estrangeiros. Em 1957, ocupou o seu último posto, em Carachi (Paquistão), desempenhando funções de Secretário da Legação Portuguesa.
A sua obra musical, constituída por uma grande diversidade de géneros (canções para voz e piano, peças para piano e obras de música de câmara), caracteriza-se por um acentuado lirismo, apresentando um carácter simultaneamente nacional e cosmopolita.
Victor Macedo Pinto faleceu no Porto, em 1964.
As sua obras são publicadas por AvA Musical Editions - http://www.editions-ava.com
Informação detalhada:
Acerca das obras gravadas neste CD
As quatro peças para piano seleccionadas para este CD revelam a excelente compreensão das possibilidades do instrumento, a admiração pela família e pela figura da grande pianista Helena Sá e Costa (a quem são dedicadas três delas), e ainda a sólida técnica adquirida por Victor Macedo Pinto (1917-1964), que denota a influência de, entre outros, Cláudio Carneyro e Fernando Lopes-Graça, seus professores de composição.
A Elegia a Luís Costa (sem data) é a obra mais “pesada” e romântica deste grupo de peças, como seria de esperar. O cromatismo da primeira secção, próximo do de um Cláudio Carneyro, é apenas contrariado pela leveza da secção intermédia, que não chega para dissipar o clima elegíaco que domina até ao fim.
Já a Espanholada (sem data) é uma pequena peça sem grandes ambições, provavelmente um presente gracioso a Helena Sá e Costa, cuja admiração pela música espanhola, nomeadamente pela de Falla e Ernesto Hallfter era notória. A linguagem eivada de pequenas surpresas tonais/modais e o picante harmónico de dissonâncias de sabor bitonal é característica de Macedo Pinto, e não obstante a simplicidade e bom humor da Espanholada, é este refinamento de escrita que a eleva, ainda assim, acima da banalidade.
A Sonatina para piano, datada de 1946, é, no meu entender, uma obra magnífica, pese embora o título que constata, nomeadamente pela curta duração da peça, e a intenção do compositor de a manter no estatuto de “pequena sonata”, sem mais pretensões. Nos três andamentos habituais, rápido-lento-rápido, a Sonatina começa com um inspirado motivo em dó Maior, pleno de juventude, o que não admira num compositor que contava à altura ainda 29 anos. Curiosamente, para uma obra desta natureza, o ambiente harmónico vai-se tornando mais pesado à medida que a música progride. O andamento lento, uma espécie de reflexão meditativa em forma de recitativo, já aponta para essa estranha direcção da música, direcção que o terceiro andamento confirma. Este usa uma armação de clave de láb Maior (ou fá menor) que não encontra correspondência na música real, que está quase sempre em dó menor. O virtuosismo exigido para este inquieto final é também mais digno de uma sonata do que de uma sonatina, e estas duas características juntas dão ao terceiro andamento um peso invulgar, que só encontra alívio no último acorde, à base de quintas sobrepostas sobre um dó grave, acorde que, graças aos sortilégios da série de harmónicos, nos dá a ilusão de um brilhante dó Maior, não obstante a ausência da terceira maior.
Pela duração, ambição formal, virtuosismo, complexidade e variedade da escrita, as Variações e Fuga sobre um tema de Emil Andersen, de 1957, são talvez o corolário pianístico de um compositor no auge das suas possibilidades técnicas e em plena maturidade artística. Construídas sobre um tema de um compositor dinamarquês hoje em dia completamente esquecido, salvo na sua terra natal, as variações são um caleidoscópio sonoro que denotam a influência (aqui numa tentativa ainda mais ambiciosa), 30 anos depois, do opus 1 de Fernando Lopes-Graça, as Variações sobre um Tema Popular Português, datadas de 1927. A variedade da escrita, o virtuosismo de algumas passagens, o género de pianismo de outras, e a preponderância de harmonias à base de quartas e quintas são alguns dos elos de ligação entre as duas obras, como é, parece-me, evidente nas variações 8 e 9. Também o neoclassicismo está presente, nas variações 11 e 12. Particularmente felizes são as variações 15 e 16, que abrem caminho, na sua exuberância, para a magnífica majestade da variação 17, que é o corolário do ciclo antes do início da complexa fuga, que usa na construção do seu tema os primeiros intervalos da melodia de Andersen. Por vezes no limite da exequibilidade pianística, esta fuga (e toda a peça em geral) tem poucos paralelos na música portuguesa para piano do século XX, e faz-nos pensar em como poderia ter sido a carreira de compositor de Victor Macedo Pinto se este a ela se tivesse dedicado por inteiro, à imagem do seu mestre Fernando Lopes-Graça, com o qual partilhou, se não o génio, pelo menos alguma afinidade estética e uma técnica apurada e séria.
As Sete Canções Antigas, para voz, flauta e piano, de 1950 (que também podem ser tocadas sem flauta), encontram paralelo noutras obras de compositores portugueses interessados no passado medieval, de Frederico de Freitas a Jorge Croner de Vasconcelos, passando por Ruy Coelho ou Fernando Corrêa de Oliveira. Usando textos de Dom Diniz e Sá de Miranda, entre outros, a pouco habitual combinação de voz, flauta e piano tenta traduzir a ambiência de época sem prescindir das modernas conquistas musicais, como se pode ouvir nas canções I e VI, onde é notória a influência do Falla das Siete Canciones Populares Españolas. Em todo o ciclo são usadas harmonias à base de quintas, segundas e quartas, em complexos modais, se bem que aqui e ali algumas passagens mais cromáticas venham “sujar” a limpidez diatónica e lembrar-nos que o autor destas canções foi discípulo e admirador de Fernando Lopes-Graça e Cláudio Carneyro.
A Missa Litúrgica (sem data), é talvez a obra mais enigmática presente neste CD, embora seja outra das peças que revela a profunda musicalidade do compositor, e o seu domínio das formas estabelecidas e das técnicas contrapontísticas mais rigorosas, como se pode verificar pelo intrincado trabalho polifónico que as vozes tecem em várias secções. O Kyrie inicial é de uma nobreza sublime, e um dos números mais inspirados de toda a obra, cuja dificuldade de execução a torna um desafio para qualquer coro. O que se segue mostra algum desequilíbrio em termos formais, com números demasiado curtos (como o Benedictus, que não comporta nenhuma repetição do texto) a contrastarem com outros bastante mais longos.
Aliás, é a curta duração da obra que poderá talvez justificar o seu título. Quereria Macedo Pinto que a obra fosse realmente cantada durante a liturgia, tendo-lhe dado uma concisão adequada à duração da mesma? No entanto, a dificuldade já referida, a que se junta aqui e ali uma complexidade harmónica que ultrapassa bastante a simplicidade diatónica do início, parecem contradizer essa eventual intenção, dado que seria necessário um coro bastante experimentado e com boas vozes, e um público e uma Igreja igualmente tolerantes com a música moderna, o que ainda não é hoje o caso, quanto mais na altura em que Victor Macedo Pinto viveu e trabalhou (também Stravinsky escreveu algumas obras destinadas a acompanhar a liturgia, obras que, pelas mesmas razões atrás expostas, falharam o objectivo). Dois dos números da Missa (o Gloria e o Credo) iniciam-se aliás cada um deles com uma frase sem compasso, aparentemente derivada de um cantochão (que não pude identificar), ou livremente escrita no estilo gregoriano, o que parece alicerçar ainda mais esta minha hipótese, dado ser essa uma prática medievo-renascentista, oriunda de um tempo onde durante a liturgia se cantavam as missas dos grandes músicos da época, como Dufay ou Josquin.
Sérgio Azevedo
1 Variações e fuga sobre um tema de Emil Andersen 14’33’’
Rui Pinheiro, piano
2 Espanholada 00’56’’
Rui Pinheiro, piano
Sete Canções Antigas
3 Cantiga de amor, Pastorela - Una pastor se queixava (D. Diniz) 01’56’’
4 Cantiga de amigo - Bem entendi, meu amigo (D. Diniz) 03’25’’
5 Cantiga de amigo - Ai flores, ai flores do verde pino (D. Diniz) 02’47’’
6 Cantiga - Que de meus olhos partays (Ruy Gonçalves) 01’33’’
7 Cantiga sua partindo-se - Senhora, partem tã tristes (João Roiz de Castel-Branco) 03’05’’
8 Cantiga de amor - Poys partis, e me leyxais (João Afonso de Aveiro) 01’18’’
9 Cantiga - Comiguo me desavym (Sá de Miranda) 01’06’’
Ana Quintans, soprano | João Rodrigues, tenor
Janete Santos, flauta transversal | José Manuel Brandão, piano
Sonatina para piano
10 Allegretto mosso 02’55’’
11 Adagio molto 03’22’’
12 Vivo
Rui Pinheiro, piano 03’40’’
13 Elegia a Luis Costa 04’28’’
Rui Pinheiro, piano
Missa Litúrgica
14 Kyrie 02’16’’
15 Gloria 03’17’’
16 Credo 05’29’’
17 Sanctus 01’28’’
18 Benedictus 01’08’’
19 Agnus Dei 01’46’’
Coro de Câmara de Lisboa | Teresita Gutierrez Marques, direcção
Tempo Total: 60’19’’
Músicos
Rui Pinheiro, piano
Ana Quintans, soprano
João Rodrigues, tenor
Janete Santos, flauta transversal
José Manuel Brandão, piano
Coro de Câmara de Lisboa
Teresita Gutierrez Marques, direcção
Coro de Câmara de Lisboa:
Sopranos
Bárbara Faria, Helena Lima, Mariana Nina, Lucina Silva, Sofia Pedro, Teresa Cordeiro
Contraltos
Isabel Torres, Liliana Silva, Vanessa Gonçalves, Sílvia Fontão, Mónica Antunes
Tenores
Carlos Reis, José Pereira, Pedro Araújo, Pedro Sousa, Vítor Gonçalves
Baixos
António Henriques, António Marques, Francisco Marques, Nuno Rodrigues, Luís Bourgard
Ref.: NUM 1202
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