Liliana Leal | Lurdes Carneiro | David Silva | Teresa Correia | Luísa Marques | Eliseu Correia | Raquel Costa | Katerina Mikusova | Nuno Arrais | Dr. Freire Soares
DIAGNOSIS - Quatro reflexões musicais sobre a profissão médica e o processo de diagnóstico clínicoDiagnosis é um projecto artístico único e inovador no panorama musical em Portugal, que tem como fonte de inspiração a metodologia da investigação clínica do trabalho desenvolvido pela Medicina em geral, mas mais especificamente pela especialidade de Medicina Interna.
Acima de tudo, a singularidade deste projecto reside no facto, de não ser a Música que se encontra ao serviço da clínica médica, mas pelo contrário, foi a Medicina que deu o mote para a realização de uma reflexão artística, recorrendo à utilização de sons, imagens e conceitos normalmente associadas ao exercício da ciência médica. Neste caso, é a praxis da Medicina Interna que serviu de inspiração para um projecto artístico, dando origem a uma obra que junta duas realidades distintas e essenciais da actividade do Homem, reunidas no único e singular universo da música.
Desde os gregos e recuperado durante o Renascimento, os grandes pensadores, como Marsílio Ficino, acreditavam na ligação estreita e imprescindível entre a Música e a Medicina, como meio entre a alma e o corpo. Supunha-se que a Música possuía poderes curativos para diversas moléstias prevalecentes naquela época, como por exemplo a peste. No séc. XVII, em plena época do racionalismo cartesiano de Descartes, desenvolveram-se algumas correntes de pensamento que reforçaram a crença da eficácia do poder curativo da música nas chamadas “doenças das mulheres” ou na melancolia (a bílis negra).
Acreditava-se que a música afectaria artérias e órgãos vitais de uma forma muito directa. A percussão, por exemplo, pelo seu poder mecânico de movimentar a elasticidade do ar, teria a capacidade de ultrapassar a resistência dos nervos, o que seria útil para pacientes inconscientes ou impossibilitados de ouvir. Os médicos acreditavam na correlação directa entre o ritmo e o tempo na música e a força e o batimento da pulsação cardíaca.
Por outro lado, a influência da Música nos humores e na pulsação era também manipulada por compositores como Monteverdi e Vivaldi, entre outros, para benefício das suas audiências.
Apesar dos enormes avanços da Ciência e da Tecnologia, à profissão médica continua a estar inerente, uma das relações mais exclusivas e intimistas do ser humano - a dedicação e o cuidado ao outro, tornando o processo de diagnóstico, um dos testemunhos mais fortes, importantes e reveladores dessa ligação. Em todos as etapas, que compõem a História Clínica, da anamnese ao exame físico, passando pelos diagnósticos diferenciais, todas elas são dimensões específicas de um processo, que revelam em si, a importância da sensibilidade do Médico no uso sábio e atento de todos os sentidos, aos quais este deve recorrer para observar, reconhecer sintomas e identificar sinais, interligando-os analiticamente em diferentes diagnósticos diferenciais, para uma síntese final de afirmação de um diagnóstico.
Como o Internista, o Músico recorre ao mundo sensorial no seu processo criativo. Esta peça procura precisamente explorar e recriar a relação do Clínico Médico com o doente, através do ver (mais do que o olhar) para o observar, tal como o músico observa um instrumento, antecipando a visão e a sonoridade dos sons e harmonias que dele quer extrair. O médico palpa e toca no doente para perscrutar o seu interior, assim, como o músico sente e reconhece o instrumento enquanto o toca.
A aptidão de desenvolver capacidades clínicas, através da percepção de pequenas nuances de sons produzidos no interior do doente, as suas características sonoras, sequências e ritmos, encontra o seu paralelo na sensibilidade do músico – compositor ou executante – para pequenas diferenças de tom, timbre ou melodia nas quais pode ser possível reconhecer a individualidade única e irrepetível do autor / executante.
Estas reflexões motivaram e inspiraram a criação de uma peça musical, Diagnosis, para dez instrumentos – violino, viola-d’arco, violoncelo, contrabaixo, flauta, clarinete, fagote, trompete, trombone e percussão - tendo como elemento comum e basilar, a sensibilidade e a necessidade do constante desenvolvimento e aperfeiçoamento destas duas expressões de arte: a Medicina e a Música.
Daniela Rodrigues
Ref.: NUM 1223
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